Os trens húngaros foram anunciados
pelo governo federal no final de outubro de 1973. Ficaram com esse
nome por terem sido importados da Hungria (fabricante: Ganz-Mavag)
em troca de café brasileiro. Uma reportagem sobre eles no jornal
"O Estado de S. Paulo" em 1973 descrevia-os como "aviões
sobre rodas". Porém,
Trem Ganz-Mavag, o "Trem Húngaro".
Foto já do "fim dos tempos", pela sua conservação.
(Autor desconhecido)
depois de seu afastamento
do trecho Rio-São Paulo, onde ele tinha de subir a serra do
Mar, segundo o pessoal da SR-4, o seu grande problema estava na tração,
feita apenas em um eixo de cada truque dos carros motores, como nos
RDC BUDD da Central. Tais trens não conseguiam vencer trechos íngremes
por si só por excesso de patinagem; já em trechos mais favoráveis
(planos ou com aclives e declives suaves) eles provaram ser excelentes,
esbanjando conforto e segurança. Os Ganz Mavag operaram por apenas
4 anos entre o Rio e São Paulo pelo motivo descrito acima, passando
a circular entre São Paulo e Rio Claro, onde, de certa forma, sofreram
menos por causa da linha mais suave, e também circularam entre São
Paulo e Santos onde deixaram de operar comercialmente nos anos 80
(lembrando que ali se usava cremalheira na serra, e não livre
aderência, como na serra do Mar no Rio de Janeiro). "Qual
era o itinerário do trem expresso que circulava duas vezes por dia
(manhã e tarde) na EFSJ indo para o litoral? Sei que ele parava em
Piaçaguera pois meu pai trabalhou alguns anos na Cosipa e utilizava
o trem diariamente para trabalhar. Lembro-me dela, pois quando trabalhei
um período em Ribeirão Pires (1983), cheguei a pegá-la na estação
ao invés do subúrbio, umas duas ou três vezes, quando eu conseguia
vê-lo pela janela (claro que "free" - nessa altura, papai
já conhecia até o bilheteiro e o mesmo fez vistas grossas!). Pois
bem, o estofado dos bancos era marrom claro e giravam 90º permitindo
que 4 pessoas conversassem de frente. muito legal. Já os Budd suburbanos
tinham bancos de fibra, gelados e duros" (Renato Gigliotti,
2002). "Em 1979 e 1980, quando fui várias vezes de trem para
Santos, havia 3 horários. Em 1974, o trem que fazia aquele trecho
era um subúrbio de aço carbono, ex-EFCB da série 100 (aqueles Metropolitan
Vickers, que devem ter vindo do Rio), lembro disso claramente, depois
parece que vieram outros, menos velhos. Soube que nos idos de 1979/80,
havia um trem húngaro que fazia esse serviço, aliás ele ficava parado
lá na estação do Valongo em dias de semana" (Paulo Filomeno,
2005). "No final dos tempos, o Húngaro só ia até Campinas,
vou ver se acho a última passagem, para tentar estabelecer alguma
data para o seu final. Me lembro que em uma determinada época, o trem
para Araguari saia às 9h29 de Campinas, assim eu precisava do Húngaro
(que partia às 7h15 da Luz) para poder chegar a tempo em Campinas
para a baldeação. Aí, um belo dia, ele parou de circular e
a Fepasa demorou um bom tempo para mudar o horário do trem de Araguari
para as 11h02. Uma coisa que chamava a atenção era a velocidade média
dele, pois com o Húngaro, eu fiz a viagem mais rápida entre São Paulo
e Campinas, 1h18 (deve-se considerar o tempo que não perdia com a
troca de locomotivas), mas de qualquer forma era uma boa velocidade
para o trecho. Os outros trens gastavam no mínimo 1h40" (Paulo
Cury, 09/2006). "De fato, fui usuário do Húngaro durante
algum tempo e o tempo de viagem entre SP e Campinas era por volta
de 1h20. Mas no final de sua carreira, cheguei a tomá-lo na
Luz ás 18h20, e só fui chegar em Campinas ás 21h30, no mínimo. Foi
em 17 de junho de 1980 que ele deixou de circular até Rio Claro, passando
a ter em Campinas seu ponto terminal" (Ayrton Camargo da
Silva, 09/2006). Já as unidades de bitola métrica que rodaram no sul
encontraram sempre trechos favoráveis para circulação, bem como encontram
hoje no Piauí, onde ainda rodam os últimos trens húngaros
(2006). "De fato, são razões
Propaganda
da RFFSA. (Acervo Jorge A. Ferreira)
bem plausíveis. Às
vezes me surpreendo com G-12s prestes a atingir 50 anos de idade,
quando outras locomotivas mal conseguiram ultrapassar 15. Outros problemas
do Húngaro citados na imprensa e que me lembro agora eram incompatibilidade
com o óleo diesel nacional, muito grosso, e truques com apoio em quatro
pontos, ao invés de apenas um ponto central, citado no artigo como
prática nacional. De toda forma, durante a década de 1970 vi vários
laboratórios nacionais com equipamentos científicos do Leste Europeu
que haviam sido adquiridos mediante troca por café. A maioria deles
estava encostada pelos mais variados motivos" (Antonio Gorni,
09/2006). "Oficialmente, essa é a história deles que seria idêntica
em qualquer trem diesel-hidráulico. Já outros afirmam que o
fracasso dos húngaros deu-se por questões políticas:
desinteresse dos engenheiros, por preguiça ou (pior) por conivência;
influência e pressão da indústria americana contra os
trens europeus; falta de manutenção por não existirem peças (de propósito).
A mesma história se repetiu com as Krupp, as LEW, as Krauss etc.etc"
(Coaraci Camargo). "O Húngaro tinha problemas sérios
de
Trem
húngaro na época de sua chegada ao Brasil. (Acervo Wanderley
Duck)
manutenção, justamente pela salada de peças multinacionais, além de
problemas de projeto, como o ar condicionado, que ou congelava ou
não funcionava. Não podia haver mesmo boa vontade com ele, numa época
onde os trens de passageiro "atrapalhavam" o tráfego de carga. Sobre
a falta de peças ser proposital, seria até possível, mas lembro que
comprar peças na Europa era muito mais difícil do que nos EUA. Para
começar, eram mais caras e a burocracia com o câmbio era especialmente
infernal para as estatais brasileiras. A própria CVRD não conseguiu
viabilizar a recuperação das suas locomotivas Krauss-Maffei e durante
a época mais dura da crise do petróleo (por volta de 1974-75) sequer
conseguia receber peças já encomendadas do fabricante, cuja fatura
era postergada propositadamente pela Cacex (quem se lembra?) para
tentar controlar a balança de pagamentos. Se para a CVRD era difícil,
imaginem para RFFSA e a Fepasa. O Trem Húngaro ainda era um
caso a parte: A Ganz-Mavag era "integradora" de componentes fora do
COMECON (O Mercado do Leste Europeu comunista), assim como a LEW fez
nas diesel vendidas para a Paulista e Mogiana. Com isso, muitas peças
tinham que ser compradas de vários fornecedores ao mesmo tempo, que
nem sempre as mantinham em estoque. Mesmo as peças húngaras
ou da Alemanha Oriental (caso das LEW) ainda tinham uma burocracia
à parte, já que a relação comercial com estes países ainda
passava pelo SNI e outras tantas siglas do regime político de então"
(Eduardo Coelho, 09/2006). "Em 2005, a última unidade dos
Ganz Mavag de bitola larga foi cortada em Manoel Feio, em decorrência
dos leilões de sucata da RFFSA, restando apenas as unidades de bitola
métrica que rodam em Teresina, que diga-se de passagem só circulam
ainda por conta das peças dos de bitola larga que foram enviadas para
lá antes da privatização da RFFSA" (Ricardo Koracsony, 09/2006).
Acima, interior do carro do trem
húngaro, segundo Paulo Filomeno, 1980 - a confirmar... (Foto
Paulo Filomeno)
Acima, trem Ganz-Mavag, o "Trem
Húngaro", em Paranapiacaba, em 1980. (Foto Paulo Filomeno).
Abaixo, fim dos tempos: um dos carros do Húngaro, o último
deles, apodrecendopróximo à passagem de nível
da estação da Água Branca, em São Paulo
(Foto: Ricardo Koracsony).
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